Quarentena Assintomática – XXIII
Autor: Joaquim Boiça
Abril corre atrás de Maio
Ao Rui Pinto, com um abraço
Abril corre atrás de Maio, de um mês qualquer por vir, na vontade que todos une de se expiar a sombra que nos persegue e separa. À distância, pressentimos o que antes vigorava o dia-a-dia, do simples gesto de proximidade ao calor da troca de um abraço ou de um beijo. Estará para breve, seja esse o tempo que for, o rompimento da teia invisível que nos amarra. E no entretanto, nesse intervalo de vida que nos tolhe, o que fazer quando a necessidade se torna absoluta de querer estar com quem se quer estar, ou de se dizer adeus, não até breve, mas até sempre?
Hoje morreu um amigo, de há muito. Lutou o que foi possível lutar, hora após hora, durante anos. Soçobrou no limite das forças que reuniu para um combate que não venceu, no meio de um outro em que todos somos compulsivamente soldados, despidos de farda, de arma que seja, apartados estando, sem espírito de corpo ou forma gregária, antes cada um por si para salvaguarda do outro. Estranha forma de estar, que corrompe a essência do que somos.
O Rui partiu numa viagem de ida que todos faremos. Nesta escrita de ausência, amigo, abraço-te, como sempre abracei, dando corpo ao instinto de sentir o que anima o ser, incondicionalmente, e lembro-te, como sempre lembrarei, até um reencontro em latitude incerta.
Oeiras, 20 de Abril de 2020,
Joaquim Boiça
Comentários recentes