Posted By on Abr 27, 2020

Quarentena Assintomática – XXVIII

EMACO


Quarentena Assintomática – XXVIII

Nota explicativa – Eduardo Martins faz-nos, em três capítulos, um relato «saboroso» do seu recurso a uma unidade hospitalar de Cascais, na sequência de um episódio de saúde…

Autor: Eduardo Martins

A MINHA IDA À URGÊNCIA DO HOSPITAL DE CASCAIS, NO DIA 20 DE ABRIL DA ERA DO CORONAVIRUS – PARTE 1

Tudo começou uns dias mais cedo. Tenho-me confinado bastante em casa,

Em parte porque não me importo de estar por cá, fazendo coisas altamente criativas, como ler alguns livros e alguns e-mails, e enviar alguns, ou ver “posts” do “Facebook”, cada um mais… “criativo” do que os outros, a fazer jogos de computador, ou a ver telenovelas da SIC, ou os vários episódios atrasados do “Comissário Montalbano”, que me deixam voltar a ouvir, e a tentar entender o que é dito naquela língua tão musical, de que ultimamente só se ouvem as desgraças do “Covid19” ocorridas em Itália…

Claro que por causa disto tudo, não tenho praticado muito exercício físico, o que muito irrita a minha “sócia confinante”, que até confessa já gostar de ir ao supermercado, para os abastecimentos, devidamente ataviada, só para sair de casa…

Desde há uns três ou quatro dias, ia-me sentindo por vezes nuns estados gripais, ligeiramente febris, e com o corpo todo partido. Tomei uns “Paracetamol”, e a coisa lá se foi aguentando…  

Ontem tive de ir a casa da minha irmã, que se tem mantido fechada desde que começou a quarentena. Eu e o meu irmão, únicos herdeiros da nossa irmã, estamos a tratar da venda da dita casa. Uma das coisas que é necessária para isso, é uma “Certificação Energética”, e já tinha ficado combinada a visita do Perito que a elabora, às 15 horas. Eu e o meu irmão lá estávamos devidamente “mascarados”…

Voltei para casa, custou-me a subir a escada, cheguei ao segundo andar a respirar com dificuldade, eventualmente por ainda ter a máscara, mas também porque cada vez que inspirava com mais força, me dava uma dor que me parecia muscular do lado esquerdo, abaixo das costelas.

Também me sentia um bocado enjoado, aliás ultimamente tenho andado com “halitose”, o que muito incomoda a Ana, como se compreende, e que eu também sinto, por ter a boca muito seca, e andar sempre a beber água…

Contei destas minhas dores à Ana, e ela confessou que quando me viu chegar, branco, e a respirar com dificuldade, pensou que eu ia ter outro enfarte, 4 Anos, 3 Meses e 9 Dias depois de ter dado entrada pela primeira vez na Urgência do Hospital de Cascais, com um Enfarte…

Considerámos que o melhor era telefonar para o SMS24.

Muni-me do meu Cartão de Cidadão, pus o telemóvel em “alta voz”, e liguei para o “808242424”… Fui rapidamente atendido, sendo debitada automaticamente a lista das opções possíveis, tendo eu escolhido como  mais adequada, a opção “2”.

Uma senhora atendeu-me quase imediatamente, tratámos da minha identificação, da autorização para ser gravado o telefonema, e da descrição do que me queixava, e passou-me para um enfermeiro, que aprofundou o diagnóstico. Dada a minha idade, e pertencendo eu a um “Grupo de Risco” e a situação pandémica em que todos vivemos, independentemente dos outros sintomas que relatei, aconselhou que me  dirigisse a um “Centro de Saúde” para fazer o “Teste CoronaVirus”.

Aqui na minha área de residência, o local aconselhado era o “Hospital António José de Almeida” mais conhecido como “Hospital de Cascais”   

A MINHA IDA À URGÊNCIA DO HOSPITAL DE CASCAIS, NO DIA 20 DE ABRIL DA ERA DO CORONAVIRUS – PARTE 2…

Como tinha relatado ontem, o enfermeiro que me atendeu no SNS24, aconselhou que me  dirigisse a um “Centro de Saúde” para fazer o “Teste CoronaVirus”, porque dada a minha idade, e os meus anteriores episódios cardíacos, eu pertenço a um “Grupo de Risco” na situação pandémica em que todos vivemos, independentemente dos outros sintomas que lhe relatei.

Aqui na minha área de residência, o local aconselhado era o “Hospital António José de Almeida” mais conhecido como “Hospital de Cascais”, e o enfermeiro disse-me que “já me tinha sinalizado” para o dito hospital, e que me devia dirigir lá e procurar a sinalização “COVID19”. Perguntei se chamava uma ambulância, ou se podia ir no carro da minha mulher. Ele disse que podia ir com a minha mulher, mas que ela tinha de ficar no carro… e que eu devia levar máscara…

Lá fomos. Na zona das Urgências, que visitara pela última vez no dia 21 de Dezembro do ano passado, quando a minha irmã fora internada, havia muito menos movimento que dessa vez. Cá fora,  uma senhora a telefonar, outra a fumar, e um motorista de uma das duas ambulâncias que estavam estacionadas de portas abertas, que me apontou o local de entrada, que de facto não estava sinalizado, que eu visse, com a indicação “COVID19”.

Entrei, o segurança mascarado disse para tirar uma senha da máquina, mas não havia mais ninguém e fui logo chamado a um “guichê”. Disse que vinha sinalizado do SNS24, o funcionário confirmou, disse para ir para a Sala de Espera, e esperar junto ao gabinete 2, até ser atendido. Estava uma utente junto à porta entreaberta do referido gabinete, e eu guardei a distância de segurança. Eu já conhecia aquela Sala de Espera. A última vez que lá estivera foi no tal dia em que a minha irmã tinha sido internada, e nessa altura havia muito mais gente. Agora as filas de cadeiras estavam mais afastadas, em cada duas cadeiras seguidas havia letreiros “COVID19”, para que as pessoas não se sentassem nelas para não ficarem tão juntas. Mas ao todo, sentadas, estavam duas pessoas, bem afastadas uma da outra.

Uma das coisas de que me lembrava da última vez que aqui estivera, e que tinham grande procura, eram as máquinas distribuidoras de café e de outras bebidas, e as de produtos alimentares por vezes não os mais adequados a uma alimentação saudável, sobretudo em ambiente hospitalar…As máquinas agora não estavam lá.

A utente que estava à porta entreaberta do gabinete 2 saiu, e eu avancei e espreitei, e  uma senhora que lá estava sentada a uma secretária mandou-me entrar e sentar. Estava devidamente equipada com viseira, máscara, uma touca e uma bata plástica verde por cima de uma farda também plástica verde, luvas azuis e penso que também umas proteções dos sapatos em plástico azul, embora não os tenha visto, mas pelo menos era esse o “Equipamento Standard” de todo o pessoal que passei a ver a partir de então naquela zona da Urgência.

Fez-me a triagem, identificou-me, e colocou-me uma pulseira verde, com um código de barras, uns números, o meu nome, data de nascimento, sexo, data e a hora de entrada – 18:20. Depois mandou-me seguir para uma sala de espera que eu também já conhecia, porque era um dos sítios onde a minha irmã também permanecera no dia 21 de Dezembro do ano passado, e onde eu e o meu irmão a íamos espreitar de vez em quando.

Agora também tinha muito menos cadeiras, sem nenhum letreiro “COVID19”, e duas camas hospitalares com pessoas deitadas. Sentadas pelas cadeiras devidamente espaçadas, estavam uma dez pessoas mascaradas. Telefonei então à Ana, a fazer o primeiro “Relatório de Progresso”, e depois resolvi procurar no “Google” o significado das “cores das pulseiras nas urgências”, e fiquei a saber que é o “Código de Manchester”, que indica, no meu caso, e no da maioria dos outros presentes, que a Verde  é “Sem risco de morte imediato. Somente será atendido após todos os pacientes classificados como VERMELHO E AMARELO”. Fiquei muito mais tranquilo… Depois reparei que pelo menos os doentes das camas tinham pulseiras amarelas…

Dai a um bocado, uma pessoa com o “Equipamento Standard”, apareceu à porta, chamou pelo meu nome, eu levantei-me, ele viu-me e fez sinal para me sentar de novo.

Entretanto outras duas pessoas também com o “Equipamento Standard”, vieram junto das camas, e deram umas “bombadas” de oxigénio nos acamados, que à vez, foram levados por aquelas pessoas, para outros lados, com garrafas de oxigénio penduradas das camas.

Depois a mesma pessoa que anteriormente me chamara, veio à entrada da sala, chamou o meu nome e pediu para a acompanhar, corredor fora, até a um gabinete, com duas secretárias e as respectivas cadeiras, uma “marquesa”, e duas cadeiras bem afastadas das secretárias, numa das quais me mandou sentar.    Parti do princípio, que este devia ser “Médico”.

A MINHA IDA À URGÊNCIA DO HOSPITAL DE CASCAIS, NO DIA 20 DE ABRIL DA ERA DO CORONAVIRUS – PARTE 3

Mas aquela pessoa que me tinha chamado, devia ser “Médico”…

Foi assim que terminei a Parte 2 da história da minha ida à Urgência do Hospital de Cascais…

E devia ser “Médico” e não “Médica”, pelo tom de voz, já que do corpo, com aquela bata plástica verde largueirona, presa atrás com banda adesiva, não se conseguia perceber mais nada senão uns olhos, por trás duns óculos, por trás duma viseira…

Fez-me uma data de perguntas sobre a minha história clínica, os meus problemas cardíacos, a medicação que tomava, e sobre a razão que me levara até ali desta vez. Foi tomando nota, levou o carrinho que tem o termómetro, o aparelho de medir a tensão arterial e o nível de oxigénio para o pé de mim, fez as respectivas medições, não tinha febre no ouvido, o oxigénio estava bom no dedo indicador da mão direita, e a tensão arterial no braço direito estava a 17 -10… Até repetiu outra vez, e continuou alta… eu disse-lhe que em casa habitualmente anda nos 13 – 8…

Escreveu mais umas coisas no computador, mandou-me ir de novo para a sala de espera, e que me iam fazer uns exames.

Fiz o segundo “Relatório de Progresso” à Ana, que continuava confinada no automóvel…

Entretanto iam passando pela sala de espera, camas hospitalares, com pessoas mascaradas e com garrafas de oxigénio atrás, empurradas por pessoas com o “Equipamento Standard”, presumo eu que destas vezes eram “Auxiliares”. e também algumas macas empurradas por bombeiros com máscara e viseira.

Passado algum tempo, não posso precisar quanto, vieram chamar-me para ir à “Imagiologia” fazer um “Raio X”. Fui até meio do corredor acompanhado por  um “Auxiliar”, que aí me entregou ao “Auxiliar” que vinha da “Imagiologia” e trazia um doente numa cama hospitalar. Foi feita uma espécie de “troca de prisioneiros”…

Depois de fazer vários “Raio X” ao tórax, sobretudo ao lado esquerdo, abaixo das costelas onde me doía mais, fui acompanhado até meio do corredor pelo “Auxiliar”, e aí ele perguntou-me se eu sabia ir até à sala de espera… Eu respondi que sim, e ele deixou-me ir…

Fiz novo “Relatório de Progresso” à Ana, que me comunicou ter feito vários telefonemas a familiares e pessoas amigas a contar-lhes onde se encontrava confinada, e por que motivo…

Entretanto eram quase sete e meia da tarde, veio uma “Auxiliar” à sala de espera, perguntar se alguém queria jantar… eu disse que ainda não me apetecia, e perguntei se ainda iria demorar muito até ficar despachado, o que ela disse desconhecer… Das dez pessoas que ali estavam, três quiseram jantar, a “Auxiliar” foi trazendo os tabuleiros, elas foram comendo, umas mais, outras menos, mas sempre fazendo críticas à qualidade do repasto… 

Novo “Relatório de Progresso” para a Ana, com o tema alimentar… e ela que já estava ali há um ror de tempo sem nada para comer, nem onde o ir buscar…

Às tantas, uma “Enfermeira”  veio chamar-me para ir fazer análises, e mandou-me sentar num dos dois sofás que havia num recanto à esquerda de quem vinha da sala de espera. Nesta sala, do lado direito, havia umas dez camas, todas ocupadas com mascarados. No meio da sala, uma quantidade de mesas com computadores e pessoas com “Equipamento Standard” em frente deles.

A “Enfermeira” que me tinha chamado, puxou para o pé de mim o carrinho  com o material, e disse-me, com uma voz muito jovem, que me ia fazer umas análises ao sangue, e ministrar alguns medicamentos, e para isso ia pôr-me um cateter nas costas da mão direita, para tirar o sangue e também dar alguns remédios por aí, mas também me ia dar uma injecção na nádega… Além disso, ia fazer a zaragatoa para ver se eu tinha o vírus.

Primeiro tirou pelo cateter o sangue para as análises, depois ligou um saco com “Nolotil”, e não sei se com “Relmus” , analgésicos e relaxantes.  A injecção  foi de “Estreptomicina”, talvez para aliviar uma eventual pneumonia…

Entretanto veio sentar-se no outro sofá um dos utentes da sala de espera, que pelas conversas que eu ia ouvindo, tinha quase um doutoramento em doenças de todo o género, com altíssima permanência em urgências hospitalares… Enfiaram-me a zaragatoa na boca, com a língua de fora,  e não me custou muito. Custou-me bastante mais quando me enfiaram as zaragatoas nas narinas… parece que elas chegaram até aos pulmões…

A “Enfermeira” perguntou se me tinha custado, e eu respondi que deve haver coisas piores, e o vizinho meteu-se na conversa, perguntando se eu alguma vez tinha feito alguma biopsia… eu respondi que não… ele, entretanto saiu, não sei se por não gostar da resposta, ou por já estar despachado…

Perguntei à “Enfermeira”, como era agora o procedimento do teste do Corona Vírus, e ela esclareceu-me que seguia para a “Plataforma” para análise,  e depois o resultado era enviado para o meu “Centro de Saúde”, e me comunicavam o resultado pelo telefone…

Mandaram-me para a sala de espera, a empurrar a torre onde estava pendurado o saco do medicamento a escorrer para o cateter, até parar de pingar.

Novo “Relatório de Progresso”, com algumas dificuldades de manuseamento do telemóvel devido ao cateter e ao tubo, mas lá consegui…

Quando deixou de pingar o líquido, fui entregar o material à sala ao lado, à “Enfermeira”, e voltei para a sala de espera. 

À porta que dava para o corredor, surgiu uma pessoa com o “Equipamento Standard” que chamou o meu nome, e me mandou segui-la. Fomos até ao fim do corredor e entrámos no mesmo gabinete onde o primeiro “Médico” me tinha atendido. Mandou-me sentar na marquesa, sentou-se à secretária,  disse que era médica, e perguntou-me o que é que se passava comigo… Eu disse que já tinha contado ao colega dela há um bocado, ela respondeu que houve mudança de turno, mas que ia ver no computador, confirmou os meus dados, e disse que os “Raio X” ao tórax eram parcelares, e de lado, e eu disse que era de onde me queixava, mas ela disse que os “Raio X” e as análises estavam todos bem, que me ia auscultar e medir a tensão e que em princípio me ia dar alta. Na auscultação estava tudo bem. O aparelho da tensão era o mesmo que me tinha dado 17-10, e continuava a dar o mesmo valor. Perguntei se o aparelho não estaria avariado, ou se eu estaria com o “Síndrome Hospitalar”, ao que ela respondeu: “Diga-me o senhor…, mas vou dar – lhe um comprimido para baixar a tensão, e já agora vamos medir a tensão noutro aparelho aqui ao lado…”. Deu precisamente o mesmo valor…

Fomos ter com a “Enfermeira”, para me dar o tal comprimido para a tensão, e me tirar o cateter, a “Médica” entretanto foi-se embora, e eu perguntei se ia ter Alta, a “Enfermeira” foi ter com uma das pessoas que estava num dos computadores, perguntou-lhe qualquer coisa, e eu vi a cabeça dessa pessoa a abanar para cima e para baixo… A “Enfermeira” veio dizer-me que me podia ir embora…

Assim fiz, passei pela sala de espera desejando as melhoras aos que ficavam, e dirigi-me para a saída, dizendo adeus ao segurança, que também me desejou as melhoras, e encaminhei-me para o carro da Ana, que estava convivendo com outros vizinhos expectantes. Eram quase 23 horas.

Arrancámos para casa, e eu fui telefonando às pessoas com quem a Ana tinha falado, a dizer que já estava na rua.

Quando chegámos a casa, a Ana disse para despir a roupa toda e metê-la na máquina de lavar, menos o casaco e o boné, que esses iriam depois para a limpeza a seco. E eu tomei um duche e vesti o pijama e o roupão.

Entretanto tocou o telemóvel dela, era um número fixo desconhecido, ela não atendeu. Logo a seguir tocou o meu telemóvel, era o mesmo número fixo, e eu atendi. Perguntaram se era eu, disse que sim , disseram que era do Hospital de Cascais, e se eu já estava em casa… disse que sim, e reponderam-me que então tinha de voltar ao hospital, porque tinha havido uma falha de comunicação e a médica não me entregara uma receita…

Perguntei se podia lá ir a minha mulher, porque não me estava a apetecer muito vestir-me outra vez, porque já estava de pijama, e ele disse que sim, que podia, e para ela dizer que ia buscar uma receita em meu nome ao gabinete 7.

A Ana, que não comia nada há uma quantidade de tempo, pegou nuns pacotinhos de bolacha Maria, e lá arrancou para uma noite de chuva a caminho do Hospital…

Quando lá chegou, conforme contou quando chegou a casa, o funcionário do atendimento, percebeu logo que era o meu caso, e veio a própria médica, desta vez de bata branca, trazer-lhe a receita, com um analgésico e antipirético, e um relaxante muscular e antiespasmódico…

No dia seguinte de manhã, recebi outro telefonema de mesmo número fixo, a perguntar se eu era o senhor Eduardo João Martins, e a comunicar que estava a falar do Hospital de Cascais, só para me dizer que o Teste do Corona Vírus dera negativo.

Eduardo Martins

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