Posted By on Jun 15, 2023

Prémios Europa Nostra distinguem Cláudio Torres como paladino do património

EMACO


Prémios Europa Nostra distinguem Cláudio Torres como paladino do património

Os Prémios do Património Cultural Europeu, anunciados esta terça-feira, consagraram o arqueólogo Cláudio Torres como “champion” (defensor ou paladino, em tradução portuguesa) do património.

O prémio ao fundador do Campo Arqueológico de Mértola foi um dos quatro que Portugal conseguiu na edição deste ano.

Breve apontamento biográfico:

Nascido em 1939. Fundador e Diretor do Campo Arqueológico de Mértola, do Museu de Mértola e da revista “Arqueologia Medieval”. Doutor “honoris causa” pela Universidade de Évora (2001). Prémio Pessoa 1991. Em 1993 foi investido pelo Presidente da República com a Grã Cruz da Ordem do Infante D. Henrique. Desde 2006, membro do Concelho Consultivo do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (DGPC). Entre 1974 e 1986, docente na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Entre 1986 e 1996, chefe da Divisão Sociocultural da Câmara Municipal de Mértola. Entre 1996 e 2002 (data da sua reforma), diretor do Parque Natural do Vale do Guadiana. Em 2001 Representante de Portugal no Comité do Património Mundial da UNESCO. Entre 1996 e 2007, Presidente da Comissão Nacional Portuguesa dos Monumentos e Sítios – ICOMOS. Entre 2004 e 2012, Coordenador Nacional da Rede Portuguesa da Fundação Anna Lindh. (in https://ceaacp.uc.pt/investigadores/claudio-torres/).

Com a devida vénia e pelo interesse e afecto manifesto do artigo de Luís Osório sobre o tema, reproduzimos o conteúdo do seu «Postal do Dia»:

O arqueólogo Cláudio Torres é um pássaro sem uma asa

1.
O arqueólogo Cláudio Torres recebeu mais um prémio internacional.

Defensor do património, guerrilheiro da memória, não desistente, corajoso… extremamente corajoso…, utópico.

Como se pode ser utópico tendo deixado de acreditar na utopia?

A partir de certa altura focamo-nos nos paradoxos, no que em nós é difícil de explicar, porventura será nisso que pensa quando, de mãos nos bolsos, passeia pelo seu campo arqueológico de Mértola; uma verdadeira cidade, um mundo que escavou para que pudéssemos melhor compreender o passado e não
nos escapasse a capacidade de sonhar.

2.
O pequeno Cláudio, nascido na Beira Alta entre montanhas e frio, desejava sair e conhecer o país e os países, compreender por que raio os pobres eram sempre pobres e os ricos sempre ricos, revoltou-se com o estado de coisas, tornou-se comunista.

Pagou com língua de palmo.

Na prisão.
Em torturas.
Em humilhações.

E a Manuela sempre presente, a sua única namorada, a pessoa que o viu jovem e idealista a esbracejar com o fascismo.

Que se orgulhou por saber que fugira da prisão num barquinho de recreio – os pides não davam nada pelos intelectuais, mas o Cláudio era valente, tinha no sangue o ar da serra, a dureza das casas e da ausência de futuro.

A Manuela que fugiu com ele para Paris.

Que viu a sua desilusão com o comunismo após uma visita à Roménia de Ceausescu.

Que regressou com ele a Portugal depois do 25 de Abril.

Que fez uma carreira brilhante como filóloga, decisiva na investigação e reconhecimento do mirandês como língua oficial.

A Manuela que depois da reforma de professora correu para o campo de Mértola por ser o país dos dois, a sua casa comum.

3.
A Manuela partiu o ano passado.

E o professor caminha agora todos os dias pelos campos arqueológicos de Mértola como se fosse um pássaro ferido, um pássaro desasado, pensativo e entre paradoxos, talvez um bocadinho perdido e na expetativa de um reencontro numa escavação final.

Cláudio Torres ganhou mais um prémio internacional. Conquistou muitos.

(O Prémio Pessoa, por exemplo)

É um dos melhores portugueses.

O único que inventou um país paralelo. Um país que fez nascer debaixo de Mértola.

Um país que é hoje visitado por gente de todo o mundo.

E por ele, todos os dias.

De mãos nos bolsos e à procura da Manuela que um dia reencontrará nos subterrâneos onde a vida acontece de outra maneira.

Que seja daqui a muitos anos, caro professor.

A Manuela não se importará de esperar e… aposto… por esta altura já deve estar bastante ocupada a estudar a língua que se fala num lugar impossível de encontrar em vida.

Mesmo que seja um grande arqueólogo a procurar.

LO

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