Posted By on Mai 27, 2022

Textos por Oeiras
– As crianças e a família Pombal

EMACO


Textos por Oeiras
– As crianças e a família Pombal

Autora: Ana Teixeira Gaspar

Até ao século XIX as crianças eram muito pouco chamadas à vida pública das famílias. Raramente apareciam nos retratos familiares e só quando cresciam lhes davam alguma importância.
Ora, Sebastião José de Carvalho e Melo, o primeiro conde de Oeiras e marquês de Pombal, como bem sabemos, viveu alguns anos em Londres e Viena, daí ser apelidado de “estrangeirado”, impulsionando costumes que, para a época no nosso país, eram bastante avançados.
A família Pombal no seu tempo era diferente da restante aristocracia. Convivia com estrangeiros, e no que diz respeito às crianças é interessante verificar alguns aspectos inovadores, aqui praticados pelo casal constituído por Maria Amália Eva de Carvalho Daun, a filha mais nova dos primeiros marqueses de Pombal, e João de Saldanha, morgado de Oliveira e de Barcarena e futuro conde de Rio Maior.
A 12 de setembro de 1789, João de Saldanha escreve ao seu cunhado, Henrique José – o 2.º marquês de Pombal -, descrevendo o quotidiano familiar na Quinta da Granja, em Sintra, propriedade deste último. Como este casal possuía bastantes filhos (ao todo tiveram 11 filhos, um dos quais foi o marechal Saldanha), os passeios eram dados por grupos consoante as idades, o que é verdadeiramente significativo da relevância dada às crianças pelo casal: “Quanto a nós a vida que se faz é a que tu nos ensinaste quando nos anos passados nos tinhas aqui de assento (…) Pouco depois [do almoço] vamos ao passeio e este é dividido em três ranchos porque os tamanhos dos filhos assim o pedem; na volta como as noites são compridas também se levam a ler” (Biblioteca Nacional, Colecção Pombalina, PBA 707, fl. 30 e 30V).
Passear as crianças, em vez de as deixar ao cuidado das amas, já era bastante inovador, agora diversificar os passeios de acordo com as idades, isso é, do nosso ponto de vista, completamente extraordinário.
O embaixador francês Marc-Marie, marquês de Bombelles, durante a sua estada em Portugal, foi visita regular da família Pombal e, a dada altura, desloca-se a casa dos morgados de Oliveira, para cumprimentar D. Maria Amália, ainda convalescente de parto recente. É recebido pela filha mais velha da parturiente, de 11 ou 12 anos, que faz de anfitriã, substituindo a mãe que, de acordo com a prática de então, não podia ainda sair do quarto. A jovem vai cantar uma ária italiana, sendo acompanhada por um negro de Angola, que dança para divertimento dos presentes (Marquis de Bombelles, Journal d’un Ambassadeur de France au Portugal (1786-1788), p. 34), o que, tendo em conta os costumes da época, em que as meninas só podiam sair de casa ou estar na presença do sexo masculino, se acompanhadas pelas mães, é verdadeiramente extraordinário e revelador de uma atitude de grande modernidade. É também Bombelles que, no seu diário, refere ser a família Pombal das raras famílias da aristocracia portuguesa a conviver com estrangeiros, frequentando as festas que estes davam, exemplificando com uma festa dada pelo embaixador inglês, Walpole, em que a maioria dos aristocratas portugueses recusou os convites, contando-se a família Pombal entre as raras excepções (idem, p. 305).
Assim, podemos concluir que a família Pombal foi verdadeiramente inovadora e moderna no que diz respeito à forma como as suas crianças eram tratadas.


Ana Teixeira Gaspar

3 Comments

  1. Muito interessante. Gostei muito. É bom saber que há sempre algo novo para aprender.
    Muito obrigada.

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  2. Obrigada Ana por esta novidade, a qual ilustra o espírito iluminado do Marquês e cuja divulgação merecia ser dada a conhecer nos compêndios escolares tão pobres de factos relevantes da nossa História.
    Margarida Farrajota

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  3. Parabéns! Texto muito interessante, revela costumes inovadores com as crianças, numa época em que estas,, de uma maneira geral, ainda eram tratadas como pequenos adultos. Quanto à recepção, que maravilha!

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